Entrevista Bruno Simões: curador da mostra brasileira “Poesia do Cotidiano”, na Semana de Design de Milão 2022

A linguagem do design brasileiro é única. Nela se somam à natureza sem igual, os saberes dos povos originários, todas as influências estrangeiras desde a colonização e a expansão territorial do século XX. O resultado é uma mistura absolutamente rica entre o universo amplo da inspiração popular e o crescente desenvolvimento tecnológico, principalmente aquele com olhar para a sustentabilidade. E é para celebrar e disseminar essas características, tão simples e ao mesmo tempo tão particulares, que a ApexBrasil – Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos promove a mostra “Poesia do Cotidiano”.

Parte da programação do “Design Re-Generation”, evento oficial da INTERNI, que ocorre na Università Degli Studi di Milano, durante o Fuorisalone até o próximo dia 12 de junho, a mostra é realizada em parceria com diversas entidades ligadas aos setores da casa e da construção, contando com cerca de 60 empresas participantes, incluindo fabricantes e designers de móveis associados ao Projeto Setorial Brazilian Furniture — iniciativa da ABIMÓVEL – Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário em parceria com a  ApexBrasil, com a curadoria de Bruno Simões, arquiteto, designer e curador especializado em design, responsável pelo ateliê que leva o seu nome. 

E é com ele, uma referência para o design nacional, que conversamos hoje. 

ABIMÓVEL – Para começar, conte-nos um pouco mais sobre seu trabalho, sua história e projetos  marcantes.

Simões – Já são dez anos dedicados à curadoria em design, período em que me estabeleci como um revelador de talentos dessa geração e, por meio de dezenas de exposições, apresentei ao mercado nomes que hoje dominam o setor criativo no Brasil. Além de mostras institucionais e em galerias nacionais e internacionais, sou sócio e curador responsável pela MADE, maior feira de design autoral da América Latina, que completa dez anos em 2023. Atuo também como conselheiro administrativo  em instituições de ensino e cultura, como o Instituto Bardi / Casa de Vidro, a escola Britânica de Artes  EBAC e a Universidade Peruana de Ciências Aplicadas – UPC, em Lima. 

Antes mesmo de atuar como curador, eu já exercitava meu olhar pelo viés do jornalismo, em que por anos fui editor de arquitetura e design da renomada publicação do segmento no País, a Casa Vogue. Foi lá que tive o privilégio de conhecer e promover novos criadores, ajudando na  transformação da visão do mercado a respeito do design nacional contemporâneo. Hoje, em paralelo aos projetos curatoriais, editoriais e educacionais em que estou envolvido, também mantenho uma prática como arquiteto, além de designer de interiores e produto em meu ateliê. 

ABIMÓVEL – Em 2022, você é o responsável pela curadoria da mostra “Poesia do Cotidiano”,  fomentando uma parceria com a ApexBrasil, bem como com a ABIMÓVEL, em uma das mais  importantes ações do ano. Como se deu o convite, qual sua relação com as entidades e como se dá  este trabalho de curadoria?

Simões – O convite para a curadoria da participação brasileira no Fuorisalone partiu da ApexBrasil. Foi uma excelente  oportunidade de voltar à Milão desde minha última curadoria na capital do design, em 2015. Em  ampla colaboração com a Agência, estabelecemos como critério para a curadoria deste ano a ideia de aproximar a história dos designers e da indústria do País ao cotidiano das pessoas. Nossa intenção é mostrar que o design está em cada gesto e em cada momento significativo da construção de nossa  identidade como nação plural e de profunda riqueza cultural e natural. 

Estabelecido esse propósito, parti para uma ampla pesquisa de linguagens de todos os cantos do Brasil, que misturam materiais, técnicas e propósitos alinhados à essa ideia de um design industrial  brasileiro genuíno.  

ABIMÓVEL – E o que podemos esperar em termos de conceito, do design e da dinâmica da mostra? 

Simões – O conceito é inédito à participação brasileira, numa mistura entre todo tipo de escala e tipologia  de móvel para contar a construção da identidade brasileira a partir do objeto mais banal ao mais sofisticado; do artesanal ao altamente tecnológico. São peças que ora representam nossa fauna e flora, ora se comunicam diretamente à nossa cultura, ou ainda salientam nossas conquistas  tecnológicas. Tudo isso está misturado numa ordem abstrata e intimista para que ao final da  exposição, o visitante saia com a sensação de que fez uma longa viagem pela recente tradição do  design brasileiro nesses 200 anos de Independência. 

ABIMÓVEL – Como se deu a escolha das peças que serão exibidas por lá? Você pode nos antecipar alguns dos highlights do evento? 

Simões – A escolha segue todos esses princípios de conexão à nossa história, nossa paisagem e nossa  cultura – tanto a artesanal como a industrial. Uma tentativa de homenagear os 200 anos de  Independência e os 100 anos da Semana de Arte Moderna por produtos que exaltam o olhar  brasileiro original. Eu queria criar uma mistura entre tradição e ousadia, entre passado e futuro. 

Temos desde o primeiro canivete fabricado no país de forma industrial, o modelo Santa Bárbara (1911), da Tramontina, até um exemplar do filtro de barro São João, da Cerâmica Stéfani (1934). São objetos e marcas que integram nosso dia a dia há gerações e que aqui são reconhecidos como criações geniais ao lado de peças de grandes nomes do nosso modernismo, como Lina Bo Bardi e  Jorge Zalszupin; bem como contemporâneos de destaque como Sérgio J. Matos, Ronald Sasson e  Domingos Tótora.  

Como não podia deixar de faltar, apresento também nomes absolutamente inéditos ao grande  público nacional e internacional, como a Ovny Company, o Molu Design, a Marcenaria Olinda, entre tantos outros que integram as 55 empresas participantes.  

ABIMÓVEL – Algum estilo, material ou tendência que valha ser destacado entre essas peças?

Simões – Cada peça da exposição apresenta uma possibilidade de uso e material que pode ser destacado,  mas acho que juntas elas sinalizam um movimento de retomada da inspiração na nossa própria  história, um olhar mais gentil para nossa cultura e aspectos regionais. A valorização daquilo que é  nosso perante o importado ou o estilo internacional tem sido nossa grande revolução de estilo, tanto  em produto como interiores. 

ABIMÓVEL – Aliás, o que estar em Milão, a meca do design, com uma mostra como esta representa em termos de desenvolvimento e globalização para o design e a indústria  brasileira?

Simões – Representa o encurtamento de distâncias ainda extensas. Representa a afirmação de que hoje  competimos em igualdade não apenas pelo viés da tecnologia de produção ou qualidade de matéria-prima, mas acima de tudo pela criatividade. São essas vozes criativas que levarão o design nacional contemporâneo à sua expansão pelo mundo, como fizeram no passado nossos mestres modernos,  hoje enaltecidos por todos os cantos. Estar em Milão com tanta expressão significa que a aliança entre indústria e designer é um caminho sem volta.

ABIMÓVEL – E o que, na sua opinião, o Brasil e as marcas brasileiras têm de mais criativo e pulsante  para apresentar e oferecer em matéria de móveis, materiais, tecnologia e design para o mercado  norte-americano e para o mundo?

Simões – A linguagem do design brasileiro é única. Nela se somam à natureza sem igual, os saberes dos povos originários, todas as influências estrangeiras desde a colonização e a expansão territorial do  século XX. O resultado é uma mistura absolutamente rica entre o universo amplo da inspiração popular e o crescente desenvolvimento tecnológico, principalmente aquele com olhar para a sustentabilidade. Justamente dessa mistura sai um conjunto de criações que se destacam no mundo, produtos que, por intermédio de sua simplicidade formal e inventividade material, são capazes de transmitir emoção e estimular o toque.

ABIMÓVEL – O que, em tempo, melhor define nossa “poesia” por meio da expressão do design de  móveis e interiores? 

Simões – A poesia está na sabedoria do valor de nossa terra e nossa cultura. O design que emociona é  aquele capaz de nos fazer parar por um segundo e apreciar um objeto pela lembrança de  experiências vividas.

ABIMÓVEL – Por falar nisso, alguma sugestão do que deveremos ver em termos de novas  tendências e movimentos no Fuorisalone 2022? O Brasil vem acompanhando estas tendências?

Simões – A materialidade será tema central, materiais naturais originais, sustentabilidade e  responsabilidade social são temas urgentes e crescentes ano a ano. Nesse sentido o Brasil tem  aumentado sua aplicação de biomateriais e atenção à origem dos materiais e sua longevidade.

ABIMÓVEL – Mais pontos que valem ser destacados?

Simões – Sim! Quem vier nos visitar no Fuorisalone será recebido com um genuíno cafézinho numa  parceria com a BSCA – Brazilian Specialty Coffee Association, para beber o verdadeiro sabor do Brasil,  produzido por cerca de 20 marcas que tem resgatado o cuidado com bem tão precioso, desde atenção ambiental até propósito social para garantir um produto de altíssima qualidade.

Imagens: ApexBrasil

Mostra “Poesia do Cotidiano”

07 a 12 de junho de 2022

Università Degli Studi di Milano – Milão, Itália

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Associação Brasileira das Indústrias do Mobiliário – ABIMÓVEL
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